Veículos de Comunicação

Comportamento

Brasileiros. Nem tanto

Queremos justiça em tudo, mas furamos a fila do supermercado, estacionamos em local proibido e vivemos no país do Gerson, em busca de vantagem

No Brasil ninguém se assume de direita, mas somos quase todos de centro esquerda. Aqueles educados que se assumem de esquerda, acrescentam o “mas nem tanto.” Queremos construir um país de estrutura moral sólida, curtindo as leis à risca, “mas nem tanto”.

Desejamos a prisão dos que tungam o erário, porém assistimos, ansiosos pela novela, o massacre diário nas favelas do Rio. Vamos a passeatas, desejamos uma revolução, “mas nem tanto.” Queremos justiça em tudo, mas furamos a fila do supermercado, estacionamos em local proibido e vivemos no país do Gerson, em busca de vantagem.

Não observamos que a corrupção se dá em níveis menores, todos os dias e não só nos grandes escalões, na operação Lava Jato ou nos mensalões da vida. Quando deixamos de emitir ou pedir uma nota fiscal estamos agindo a favor da corrupção. Quando falsificamos a carteirinha de estudante ou quando compramos produtos falsificados também. Furando fila, não denunciando o gato do vizinho para roubar energia elétrica ou TV a cabo, quando tentamos subornar o guarda para evitar uma multa de trânsito idem.

Estamos chocados com a tragédia da barragem em Minas, mas nem tanto.  Embora vítimas do maior desastre ambiental da história do Brasil, os habitantes da região pedem a volta da Samarco à plena operação, porque estão desempregados. Prefeitos e vereadores regurgitam os royalties reduzidos dramaticamente. Como resultado, queremos a punição exemplar a Samarco e da Vale, mas nem tanto.

Vibramos com os novos indiciados das incontáveis operações da PF e do MPF, mas não temos a menor ideia do que vem a seguir. Nossa novela judiciária terá novos capítulos em breve, e com raras exceções, continuamos apaixonados pelos mesmos personagens tal qual um “Show de Truman” às avessas, com uns poucos controlando o destino de todos nós, sem que ao menos percebamos. Quem é o suplente do Dudu Cunha? Porque o Paulo Roberto devolveu sua lustrosa tornozeleira? Quem vai administrar o espaço comprimido entre o Oiapoque e o Arrio do Chuí?

Queremos mudar o Brasil, mas nem tanto. Não queremos sujar as mãos da tinta eleitoral, como se abstenção lhe garantisse um alvará de soltura prévio pelo crime de omissão à pátria que você acaba de cometer. Queremos mudar o Brasil, mas nem tanto. Por favor ponha o despertador para amanhã cedo e acorde, brasileirinho.

* Júlio Gavinho- É executivo da área de hotelaria