Veículos de Comunicação

Oportunidade

Casal três-lagoense consegue registro do filho de “barriga de aluguel

Este é o primeiro caso de todo o Centro-Oeste (MS, MT e GO)

Um casal de Três Lagoas conquistou na Justiça do Mato Grosso do Sul, o direito de registrar em cartório da comarca local, o filho de uma gestação de útero em substituição, popularmente denominado de “barriga de aluguel”. O cartório havia negado o registro.

A determinação foi dada pela juíza de Direito Aline Beatriz de Oliveira Lacerda, da Vara de Fazenda Pública e Registros Públicos de Três Lagoas (MS), que levou em consideração os documentos juntados aos autos, concluindo não haver desconfiança que a criança é filha biológica do casal em questão, apesar dela ter sido gerada em outro útero.

O advogado Alexandre Beinotti, representou as partes interessadas e falou com a reportagem do JPNews.

Segundo ele, a medida judicial foi tomada no fim do ano passado, porém, em virtude das festas do final do ano, assim como do próprio recesso do Poder Judiciário, a decisão foi publicada neste mês de janeiro.

Conforme explica o advogado, a criança foi gerada no útero da irmã do pai biológico.

Para ele, o que torna essa decisão inédita é o fato de que o registro em nome dos pais biológicos foi determinado pelo juiz sem a necessidade de realização de exame de DNA, uma vez que as provas apresentadas foram suficientes para convencer promotor e juiz da filiação alegada.

Questionado se existem outras ações como esta em Três Lagoas ou no Estado, o advogado afirmou ser difícil dizer se há outras até mesmo no País, uma vez que, processos dessa natureza correm em segredo de justiça. “O que foi possível apurar é que essa decisão é inédita em todo o Centro-Oeste, o que a torna tão importante e significativa”, avalia.

De acordo com o defensor, o casal tentou por 10 anos a oportunidade de ter um filho gerado no ventre da esposa, fato que, por questões biológicas, isso não era possível.  

Com relação ao resultado positivo, o advogado comentou que a família estava muito feliz, especialmente por não ter havido a necessidade da realização do exame de DNA.

Beinotti ressalta que a decisão comprova que o Poder Judiciário não é um ente letárgico e/ou indiferente as novas questões, mas sim o contrário, ou seja, que ele acompanha as mudanças culturais, sociais e tecnológicas, no intuito de sempre buscar seu objetivo maior, que é a solução de conflitos ou das questões que lhe são apresentadas. “Registro que tanto o juiz, quanto o promotor do caso foram importantíssimos para o resultado da ação, já que pensaram o direito de forma célere, atual e adequada a uma sociedade moderna e em constante modificação”, acrescentou.

Sobre a decisão tomada na Comarca de Três Lagoas abrir precedente em todo o Brasil, o defensor avalia que, toda questão que possuir natureza semelhante poderá ter como base a decisão proferida pelo juiz da Vara de Fazenda Pública e Registros Públicos de Três Lagoas de MS.

Com relação ao referido cartório ter ou não a obrigação de, a partir deste caso, registrar as crianças geradas por meio de “barriga de aluguel”, Beinotti deixa claro que, essa decisão não muda a forma como o cartório deve proceder o registro de nascimento. “Quando a criança nasce, seus pais ou responsáveis devem registrá-la no Cartório de Registro Civil, a fim de que esta possa "existir". Agora, para que o registro seja realizado em nome dos pais biológicos (em caso de útero em substituição, por exemplo), o mais indicado é que este casal procure um advogado para auxiliá-los a obter esse fim”, esclareceu.

Como não há leis específicas para os casos de “barriga de aluguel”, Beinotti não acredita que isto possa prejudicar o andamento de ações judiciais, uma vez que, ainda que não haja lei específica regulamentando o tema, o juiz pode fazer uso de outros mecanismos para proferir sua decisão, como as fontes do direito, a analogia, os costumes, a própria jurisprudência e sem dúvida o bom senso.

BASE DA DECISÃO

O advogado forneceu à reportagem do JPNews, alguns trechos citados nos autos, pela juíza de Direito Aline Beatriz, referente à sua decisão no caso.

Em um dos trechos da sua alegação, a juíza frisou que, “hodiernamente os procedimentos médicos no campo da fertilidade estão cada vez mais avançados, devendo o registro civil acompanhar as mudanças culturais e tecnológicas para que se garanta a efetiva verdade registral”.

A magistrada também deu ênfase ao diferencial entre ser ou não pai e mãe biológicos.

"Nada mais autêntico do que reconhecer como pais aqueles que agem como pais, que dão afeto, que asseguram proteção e garantem a sobrevivência. É necessário encontrar novos referenciais, pois não mais se pode buscar na verdade jurídica ou na realidade bio-fisiológica a identificação dos vínculos familiares. A relação parental não é só um ato físico, mas, principalmente, um fato de opção, extrapolando os aspectos meramente biológicos. O avanço no campo dos procedimentos de fertilidade acabou com a presunção de que a maternidade é sempre certa devendo o registro civil acompanhar essa evolução."

Vale destacar que, o advogado Alexandre Beinotti concordou em repassar à reportagem do JPNews as informações relacionadas com o caso, porém limitou em algumas delas, informando que entre ele e os clientes ficou acordada cláusula contratual de confidencialidade, ou seja, alguns dados, ainda que indiretos, seriam omitidos, como identidade da criança, dos pais biológicos e da mulher responsável pela gestação em útero em substituição.

Em relação à idade dos envolvidos adultos, Beinotti informou que eles têm entre 30 e 40 anos.

 

* Matéria editada às 8h10 do dia 09 de fevereiro, para alteração de informação. A criança foi gerada no útero da irmã paterna, e não da irmã materna, como estava descrito na matéria anteriormente.