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Editorial: Gastos bem acima da coerência

O mau maior está no uso do Poder Legislativo para ações assim, que não visam o interesse público

A revelação de um dado, um número, em reportagem assinada pela jornalista Ana Cristina Santos, nesta edição do Jornal do Povo, chamou a atenção e consolidou, por razão, a causa de uma ação impetrada na Justiça pelo promotor Fernando Lanza, na semana passada, contra a Câmara de Três Lagoas. E trata-se de um detalhe que certamente não fugiria aos olhos do leitor, mesmo que não ganhasse o destaque contido na reportagem da página ao lado, sobre gastos dos vereadores da cidade neste ano.

É evidente que o promotor não se atentou somente a este número para propor a ação que pede a demissão imediata todos  os 108 funcionários contratados diretamente pelos políticos – aqueles sem concurso, geralmente contratados por imposição de partidos, de financiadores de campanha, por relação de parentesco ou apenas por amizade – critérios pouco indicados para definir capacidade, habilidade ou experiência.

Mas, é verdade que não precisa ser promotor público e nem especialista em qualquer outra área para notar que há mesmo “uma irrazoabilidade” no número de servidores em cargos de confianças, enfiados nos gabinetes da Câmara. Somente o gasto de R$ 4,7 milhões com  salários dos 108 já revela flagrante discrepância contra R$ 1,7 milhão pagos de janeiro e dezembro aos 30 concursados.

Não é verdade que os comissionados ganham mais que os concursados. A diferença da média salarial é de R$ 1,3 mil. Mas, considere-se que há disparidade flagrante no número de assessores nas duas condições de contratação. E também não há que se traçar comparação com o volumoso salário e benefícios dos vereadores três-lagoenses – os mais bem pagos entre as câmaras de cidades médias do Estado, de São Paulo e, possivelmente, de todas as demais unidades da Federação. 

A reportagem que encerra o acompanhamento sobre dados deste ano mostra que os vereadores torram alto com viagens, verbas indenizatórias; que gastaram com gasolina o suficiente, em quilômetros, para dar mais de quatro voltas na Terra. 

Diante de gastos assim, não é para menos o promotor avançar sobre o abuso na contratação de comissionados,a exemplo do que faz o Ministério Público Federal, que pede a redução dos 23 mil comissionados subordinados a ministérios, secretarias e ao gabinete da presidente Dilma Rousseff. É de lá que vem a conclusão de que o ideal é haver contratações por concurso público, sem apadrinhamentos e, evidentemente, sem fraudes.

Exatamente como ocorre em outros órgãos públicos, fica evidente que não haveria espaço em gabinetes para acomodar os servidores se todos fossem trabalhar ao mesmo tempo. Mas, este, ainda, não é o maior problema, assim como o gasto que  estas contratações representam.  O mau maior está no uso do Poder Legislativo para ações assim, que não visam o interesse público. Fazem parte apenas de estratégias eleitorais.