Veículos de Comunicação

Opinião

Meme da (in)justiça

 Na semana em que a ministra do STF e primeira presidenta do TSE, Cármen Lúcia, virou meme das redes sociais ao declarar o óbvio – quase ridículo! – a respeito da intolerância dos cidadãos brasileiros com a corrupção, o Poder Judiciário deu o tom e a resposta mais emblemática acerca da vasta e insolúvel impunidade dos criminosos políticos no Brasil.

Enquanto a Suprema Corte se prepara para o início do julgamento que pode levar à cadeia os 38 acusados no escândalo do Mensalão no governo Lula da Silva, esses réus estão conseguindo escapar em outras instâncias de condenações por improbidade administrativa e da obrigação de devolver ao erário os bilhões roubados e desviados pelo maior esquema de corrupção que o país já viu.

A título de esclarecimento, a ação penal que começará a ser julgada no próximo dia 02 de agosto prevê apenas condenação à prisão, o que, sinceramente, não é suficiente. As ações cíveis propostas pelo Ministério Público estão empacadas na Justiça Federal e são elas que, por origem, podem condenar os réus por improbidade, subtraindo-lhes os direitos políticos por até 10 anos (Lei da Ficha Limpa) e determinando o ressarcimento dos danos causados ao patrimônio público.

Só para que se tenha ideia da irresponsabilidade e da falta de compromisso da justiça brasileira, uma das ações está parada há mais de 2 anos porque o Ministério Público Federal incluiu um cidadão que tem um homônimo e a Justiça Federal ainda não conseguiu descobrir e localizar quem é o verdadeiro acusado. Muito além do anacronismo técnico em plena era digital, trata-se de nauseabunda cumplicidade e camaradagem com crime e, principalmente, contra o bolso dos cidadãos que pagam a maior carga tributária do planeta para sustentar esses vagabundos.

Em outra ação contra os mesmos réus, que tramita na 6ª Vara Federal, em Brasília, diante da estagnação do processo, a Procuradoria da República determinou o cumprimento dos prazos processuais. A ordem do procurador é bastante clara: “A ação foi proposta em 2007 e, a despeito de sua notória relevância para o interesse público, ainda não se chegou sequer à fase de recebimento da denúncia”. O que essa Vara candanga está esperando? Que os crimes prescrevam?

Os absurdos não param por aqui. Conforme matéria-denúncia do jornalista Vinícius Sassine, de O Globo, o chamado núcleo do esquema do Mensalão – José Dirceu, Marcos Valério, Delúbio Soares, José Genoino e Silvinho Pereira – se livrou de um processo porque o juiz federal do caso, AlaôrPancini, afirmou que eles já são réus em outras ações semelhantes. O mesmo Pancini já suspendeu, desde 2009, outros dois processos contra a quadrilha, como classificou o procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza. Em suma e para perplexidade da nação, os mensaleiros vão, confortável e paulatinamente, escapando de julgamentos em outras instâncias judiciais.

Não adianta a ministra Cármen Lúcia redundar em firulas sobre o cansaço dos brasileiros com a corrupção. O que o cidadão realmente não tolera mais é a impunidade absoluta, o descumprimento das leis, a ausência e a leniência de um Judiciário caro demais, corporativo demais e eficiente de menos. Ou a Justiça no Brasil começa a ser verdadeiramente célere e minimamente responsável, ou vamos continuar plantando coquinhos e memes vazios nas mídias interativas.

Helder Caldeira é escritor, jornalista a apresentador de TV