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O xilindró dos mensaleiros

 Depois de mofar por longos anos nas mesas empoeiradas do Poder Judiciário, finalmente chegamos aos dias do grande julgamento. O momento decisivo que pode quebrar o paradigma histórico brasileiro de que o crime político tem impunidade garantida, de que não há punição para os canalhas nacionais. Das quase 50 mil páginas do processo do Mensalão podem sair mais de 1.000 anos de prisão aos 38 réus do maior esquema de roubo e desvio de dinheiro público da história republicana do Brasil.

Até aos críticos mais severos e à oposição mais arraigada, restará alguma dor ao fim do julgamento, com a sentença pronunciada pelo Supremo Tribunal Federal. Seja o destino uma condenação ao xilindró ou absolvição para doces férias em mansões compradas com dinheiro roubado, quatro dezenas de homens públicos arrolados no processo deixam seus nomes e sobrenomes enodoados para sempre na história.

Porque o tempo é – e sempre será! – o grande protagonista da justiça. E a verdade pertence a esse tempo. Não é difícil imaginar, por exemplo, a condenação que virá daqui há 20 ou 30 anos aos familiares desses bandidos pseudopoderosos do governo Lula da Silva. Apontarão na rua: “aquele ali é o neto do ex-ministro que foi considerado ‘chefe da quadrilha’!”; ou “aquele é o bisneto do ex-deputado que jogou titica no ventilador!”; ou, ainda pior: “o currículo do cara é bom, mas ele é descendente de mensaleiro e filho de peixe, peixinho é!”. Independente do resultado no STF, o tempo lhes será implacável.

O mesmo destino terá o ministro Dias Toffoli: caso se declare impedido de participar do julgamento – o que, no senso comum, deveria ser uma regra e não uma escolha –, chancelará seus laços mais que afetivos com a quadrilha; caso participe, qualquer que seja seu voto, desqualificado estará. Absolvendo seus companheiros, será fuzilado eternamente pela opinião pública como um togado apaniguador; condenando-os, deixará o registro histórico de que sua decisão foi um mero oportunismo pedestre, em detrimento às obrigatórias imparcialidade e constitucionalidade de uma Suprema Corte, lugar onde jamais deveria ter entrado.

Muitas vezes, acabamos acreditando que as instituições brasileiras tem uma péssima e leniente condução com o vasto universo de políticos corruptos brasileiros. Pelas mais diversas e reais razões, infelizmente essa é uma verdade em nossa sociedade. Mas não podemos deixar fugir a compreensão de que essa estirpe de bandidos, ladrões de tal envergadura, leva consigo sua árvore genealógica. Conduz, através do tempo, a tatuagem n’alma das excrescências e ardis daqueles que, hoje, são julgados por planejar e executar um grandioso esquema de roubo de dinheiro e bens públicos.

O melhor exemplo dessa dinâmica talvez seja o próprio ex-presidente Lula. Ainda que não tenha sido arrolado como réu e que seja um declarado ignorante da roubalheira em sua gestão, sujou – para sempre! – sua história, sua trajetória, seus discursos paladinos e sua gigantesca aprovação populista. Mártir petista, findará seus dias como pai carinhoso de nauseabundos companheiros. Xilindró agora é o que menos importa. A condenação já existe e será propalada pelo tempo. E o tempo é maior que a própria democracia, ou a ausência dela.

HELDER CALDEIRA é  escritor, Jornalista a Apresentador de TV.