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Opinião

Planejar é preciso

A conurbação  na Capital paulista, na sua área metropolitana e nos eixos de Campinas, São José dos Campos, Sorocaba, ABC e Baixada Santista, está levando o Governo do Estado de São Paulo a assumir um programa de ampliação das faixas de rolagem de suas principais rodovias: Anhanguera, Bandeirantes, Imigrantes, Ayrton Senna e Raposo Tavares, em investimentos na casa dos 250 milhões de dólares. Estimam-se 400 mil veículos beneficiados com o empreendimento, contudo, debalde o esforço. Essas obras não resolverão os gargalos no trânsito das referidas vias, diariamente sufocadas e afetando um milhão de pessoas que demandam o complexo metropolitano e que melhor seriam atendidas com benfeitorias nos diversos modais de transporte coletivo. Do que se depreende ser tópica a medida em projeto porque não subordinada a um equacionamento que considere as múltiplas implicações anteriores e posteriores à sua aplicação, com base em planejamento integrado e voltado para antever e resolver os problemas próprios da expansão urbana na região.
Variações de um mesmo tema, tome-se o exemplo das recentes medidas de força no Rio de Janeiro, com verdadeiras ações de guerra para retomar territórios ocupados pelo crime organizado. No temor de que a intervenção se reduziria a mero episódio no confronto com a criminalidade, transferindo-a de uma favela para outra ou do Rio de Janeiro para outros centros , o Poder Público entendeu de se fazer atuante no espaço ocupado e no seu entorno, pela instalação, não só das UPPs, mas de todo um dispositivo de atendimento social permanente e de aplicação de políticas públicas no nível municipal, estadual e federal com o propósito de erradicar a presença e a atuação da bandidagem, até então, cevada na desordem e na afronta à lei.
Os dois exemplos acima não são exclusivos da metrópole, eis que reproduzidos em qualquer cidade, grande ou pequena. Eles realçam que o planejamento urbano se faz necessário como preventivo e profilático na solução quanto à ocupação equilibrada do espaço urbano, devendo, portanto, sempre prevalecer sobre o personalismo, a demagogia, a incúria, o equívoco e o despreparo ou o comodismo do  “deixar para depois o que deveria ser feito agora”, síndromes que, infelizmente, parecem endêmicas na administração pública, aqui ou alhures.
Relativamente à urbanização, parece ser ela inerente ao nosso destino.   O homem é gregário por natureza e urbano por necessidade, tanto que a sua história integra o fenômeno da urbanização desde as vilas neolíticas, passando pelas cidades de 6 mil anos atrás para chegar aos conglomerados de nossos dias. Nessa trajetória milenar, o homem procurou a cidade para abrigar-se dos perigos do ambiente agreste e da hostilidade de seus iguais e, em tal afã, assegurou uma sobrevivência somente possível na vida comunitária e na norma coercitiva que submete o indivíduo ao interesse coletivo. Quando assim decidiu, as cidades se multiplicaram e expandiram seus perímetros e vêm se institucionalizando ao longo dos séculos. Em um planeta com mais de 7 bilhões de pessoas e com uma China que se urbaniza anualmente ao assombroso número de 500 mil habitantes, o inevitável significa planejar a vida urbana para não torná-la a realidade atroz e perversa mostrada em filmes de ficção científica. As cidades surgem; algumas até declinam ou desaparecem, mas a regra é o crescimento, a expansão de sua malha urbana, o mais das vezes desordenadamente.
Ora, expandir a malha urbana significa distender, também, a  malha da infraestrutura: as redes de água e esgotos, de energia e iluminação, de gás, de telefonia, de vias públicas; expandir a malha urbana significa descentralizar os serviços públicos essenciais, notadamente de segurança, saúde e educação; expandir a malha urbana significa, enfim, propiciar à população que nela vive ou que dela desfruta, a presença do Poder Público em níveis mínimos de garantia do exercício da cidadania. Tradução final: essas ações todas custam dinheiro difícil e escasso porque, além do cotejo entre necessidades e possibilidades, tem sua fonte na própria contribuição da coletividade a ser beneficiada. Afinal, no ajuste social que suporta a civilização é obrigação de todos garantir o direito ao bem comum e é nas comunidades organizadas, nas cidades para melhor dizer, que esse principio vale mais.
Planejamento contemplando um horizonte de tempo de médio e longo prazo e que consulte os interesses da comunidade afetada é de todo indispensável para marcar uma gestão, não só profissional e apoiada em técnicas sofisticadas da moderna Administração, mas – e principalmente – fundada no atendimento às necessidades do homem comum que luta pela sua sobrevivência e precisa de saúde, educação, segurança, lazer, cultura, meio ambiente hígido, transporte público de qualidade, enfim, essas conquistas próprias da valorização da cidadania e da ocorrência da democracia.

Hélio Silva é economista e advogado