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Opinião

História regada or sangue

Lembro-me da época em que ainda se estudava História das Américas nas escolas. Por isso, sabíamos que o Haiti fora o primeiro país a abolir a escravatura, um século antes do Brasil.
No tempo da colônia, foi o país mais rico das Antilhas. O solo fértil possibilitou a produção de cana a ponto de tornar-se um dos maiores exportadores de açúcar do mundo, …  às custas do trabalho escravo. Em 1792, uma revolta popular pôs fim ao regime escravocrata. Quatro anos após, Napoleão tentou impor a volta da escravidão, mas a revolta foi tal que em 1804 o povo conquista a independência da França. Também desta vez, constituiu-se no primeiro país latino americano a proclamar a independência e iniciando a primeira República Negra das Américas.
Desde então, foi sucessivamente ameaçado sacudido durante todo século XIX: golpes e contragolpes foram desferidos conforme os interesses imperialistas. O mais famoso foi perpetrado em 1888 pela invasão dos marines estadunidenses. A seguir, durantes três décadas, uma ditadura levou o país aos tempos do escravismo (1915 a 1934).
A memória acusa um terrível período de ditadores sanguinários que comandaram tropas paramilitares, de 1957 a 1986, com Duvalier (Papa Doc) e Duvalier Filho (Baby Doc). Contraíram dívidas impagáveis junto aos imperialistas. O terror foi instalado pelos tonton macoutes por eles comandados: mais de três dezenas de milhares foram assassinados ou desapareceram. Nos quatro anos seguintes, juntas militares se sucederam.
Em 1990, o padre Jean-Bertrand Aristide se torna presidente mas um golpe militar o depõe após apenas um ano. Novamente golpes e contragolpes se sucedem ao bel prazer, conforme interesses imperialistas. Até que Jean-Bertrand Aristide é novamente eleito. Interesses estadunidenses e franceses desferem novo golpe em 2004 e tropas estrangeiras ocupam o Haiti, desta vez sob o argumento da estabilização. 
Desde então, as chamadas tropas da ONU, comandadas pelos forças armadas brasileiras, ocupam o Haiti. Hoje, o Haiti de “pérola das Antilhas” foi reduzido a pais mais pobre das Américas, com 80% da população abaixo da linha da pobreza. Os últimos furacões e, agora o terremoto completou o quadro de miséria, instabilidade, desespero.  Que os urubus de sempre não se aproveitem mais uma vez da miséria do povo haitiano.
Nos últimos anos temos recebido missões haitianas que nos visitam para relatar o que tem ocorrido no país ocupado. É estarrecedor. Nesses últimos dias, perdemos três companheiras haitianas da Marcha Mundial das Mulheres. Acabamos de receber a grata notícia de que Didier, um dos que nos visitaram está bem.
Já passou da hora de devolver ao povo a autonomia e a autoconfiança, com verídica ajuda humanitária, por meio da reconstrução do país (sem atender aos interesses das grandes empresas construtoras), pela solidariedade dos países latinos.
Oxalá o Brasil descubra uma genuína missão de paz e solidariedade.

Iolanda Toshie Ide é professora