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Brasileiros na Argentina: os novos sonhos de consumo

Buenos Aires nunca esteve tão verde e amarela. Brasileiros em profusão descobrem as delícias do nosso maior vizinho. Bifes de chorizo, doces de leite, alfajores, empanadas e sorvetes não deixam saudades da dupla arroz e feijão. A combinação entre Real forte e Peso fraco enche as sacolas de suéteres e casacos de couro, comprados nas adjacências da Calle Florida. O crédito farto possibilita viagens parceladas a perder de vista. Torna-se irresistível neste cenário, cruzar as fronteiras do país pela primeira vez.
 
Grande parte dos novos viajantes pertence à nova classe média, composta de trabalhadores que até pouco tempo contentavam-se com excursões de um dia – a maior agência de viagens das Américas surgiu neste nada glorioso nicho de mercado. Sociólogos, economistas e cientistas políticos debatem as consequências e reflexos na sociedade, economia e política.
 
Profissionais de marketing por sua vez analisam mercados e tendências, as quais possam se traduzir em oportunidades. Uma ferramenta bastante conhecida, utilizada para categorizar os desejos dos consumidores é a pirâmide de Maslow, psicólogo americano nascido no século passado e criador da hierarquia das necessidades humanas. Conforme o autor, as aspirações dos indivíduos obedecem a uma escala de valores, cuja complexidade aumenta à medida que avançamos na pirâmide. Em cinco passos, ajudam a compreender as atitudes e comportamentos da nova classe média. Vejamos.
 
Necessidades fisiológicas: ligadas à sobrevivência e preservação da espécie. A explosão na venda de iogurtes e bebidas lácteas, logo após a introdução do plano Real, é um recente exemplo de necessidade básica não atendida.  Quinze anos foram suficientes para inverter a lógica entre classe social e obesidade.
 
Necessidades de segurança: uma vez satisfeitos os desejos fisiológicos, há uma busca pela proteção e abrigo. As vendas de materiais de construção – cimento, tijolos, caixas de água, janelas e pisos – cresceram fortemente nos últimos anos. Casas são construídas, reformadas e ampliadas, disparando o número de puxadinhos e meias-águas. 
 
Necessidades sociais: associação, participação e aceitação. As igrejas evangélicas souberam aproveitar esta lacuna, inserindo-se nas comunidades de forma pioneira, antes mesmo da explosão do consumo.
                                              
Necessidades de status e autoestima: talvez o pilar mais beneficiado pelo crescimento da nova classe média. Geladeiras, freezers, televisores de tela plana, computadores e aparelhos de som foram as primeiras aquisições. Algumas garagens já exibem carros usados ou zeros de baixa potência, adquiridos com a redução do IPI. Viagens nacionais ao Nordeste e agora internacionais à Casa Rosada são os novos sonhos de consumo.
 
Necessidades de autorrealização: desenvolvimento pessoal e atualização. Cursos tecnológicos, educação à distância e graduação de curta duração, são algumas opções disponíveis e de baixo custo. Em geral jovens de classe baixa, cujo desejo dos pais é que possam começar num degrau mais alto, na escala de hierarquia das necessidades humanas.
 
A teoria de Maslow demonstra grande aderência entre os comportamentos, atitudes e padrões de consumo da nova classe média. Apesar do forte crescimento nos últimos anos, há ainda muitas oportunidades, haja vista as famílias não evoluem de maneira homogênea.

A despeito da Copa, julho será o mês dos brasileiros em solo portenho. Apesar da rivalidade e fracassos de ambos, os emergentes brasileiros se livraram de ver Maradona realizando sua necessidade de autorrealização em pleno obelisco. Situação que nem os argentinos merecem.
 
Marcos Morita é mestre em Administração de Empresas e professor da Universidade Mackenzie