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Três Lagoas

?A ignorância pode gerar pânico?

A entrevista da semana é com a doutora em Ecologia Maria José Alencar Vilela

Maria José Alencar Vilela reside em Três Lagoas, desde 1992, para atuar como professora efetiva da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Doutora em Ecologia ela afirma que a grande vantagem de morar Cidade, comparado com grandes centros urbanos é o fato de poder contar com uma vida mais saudável. Nessa entrevista ela fala sobre os desafios ambientais do município, defendendo que o fundamental é o cumprimento da legislação ambiental e o esclarecimento da população. Quando ocorre um desastre ambiental, ela alerta que “a ignorância pode gerar pânico”.

Jornal do Povo – Três Lagoas tem sido referência no desenvolvimento econômico do Estado, recebendo dezenas de indústrias, pouco se fala, no entanto, no desenvolvimento sustentável.Na sua opinião, estão sendo tomados os devidos cuidados para que o meio ambiente da Cidade não seja prejudicado? O que precisa ser feito para evitar grandes impactos ambientais na Cidade?

Maria José Alencar Vilela – Não saberia dizer se TODOS os cuidados estão sendo tomados; em boa parte creio que sim. Para evitar maiores danos, a administração pública e os órgãos ambientais competentes devem, rigorosamente, fazer valer a legislação vigente, o que pode diminuir bastante os impactos ambientais. As empresas também devem se engajar nesta luta, seguindo uma tendência mundial. Outra medida consiste em selecionar previamente as indústrias que venham a se instalar na cidade, evitando aquelas com elevado potencial de causar impactos ambientais negativos. 
 
JP – Recentemente, tivemos o exemplo, de um acidente industrial na sede da Fibria, que poluiu todo o ar da Cidade, causando inclusive problemas de saúde na população? Qual sua análise sobre este episódio. Este tipos de problemas ambientais tendem a ser comuns com as instalações destes megaemprendimentos?

MJAV – Existem atividades que geram resíduos perigosos ao meio e à saúde, com maior potencial de impactos ambientais. Significa que, embora existam medidas de controle, os riscos continuam existindo. Quando ocorre algum imprevisto, dá-se o que chamamos desastre ambiental. A partir da instalação de uma fábrica com alto potencial poluidor (esta ou outra qualquer), o município estará sujeito aos riscos. Para evitar ao máximo, há que se ter controle rigoroso, medidas para socorro urgente e esclarecimento à população. A ignorância pode gerar pânico, conforme se verificou neste caso.  

JP –  A Prefeitura, no mês passado, instalou o primeiro grupo de lixeiras para materiais recicláveis na praça Ramez Tebet. Como vê esta questão da reciclagem do lixo. O que precisa ser feito para que realmente a reciclagem do lixo seja efetivamente praticada por toda a sociedade?

MJAV – O lixo é um grande problema no mundo todo e medidas para sua redução e reuso de materiais são de extrema importância para o meio, a qualidade das águas, a economia de recursos naturais e certamente são muito bem vindas. Mas o tratamento deve ser completo, não adianta coletar separadamente e esse material ir parar no mesmo lixo comum. Para dar certo, é preciso um esforço conjunto de escolas, poder público e empresas para orientar a população a adotar essa causa. É uma questão de despertar nas pessoas o sentimento de respeito e amor à vida. Não é fácil, mas precisa ser buscado. 

JP – Em maio, você elaborou um parecer técnico, encaminhado à Secretaria Municipal do Meio Ambiente, onde aponta que a pesca na Lagoa Maior deveria ser proibida? Por quê?

MJAV – O parecer atendeu a uma solicitação da Secretaria de Meio Ambiente. Sou a favor da proibição da pesca por várias razões: colabora com a sujeira, representa risco aos caminhantes, devido ao anzol de pescadores desatentos (existem relatos), e, principalmente, é impossível se ter total controle da qualidade da água. Mesmo controlando esgotos, não há como deter a entrada de água das ruas em dias de chuva, que leva fezes e tantos outros resíduos para a Lagoa. Temos opções de pesca saudável em nossos rios. Para produzir peixes e matar a fome da população, a Lagoa deveria obedecer aos padrões exigidos para uma piscicultura e não acredito ser esta sua função. 

JP – Você não acha que deveria se mudar a grade curricular do ensino fundamenal e colocar como obrigatório uma disciplina visando a Educação Ambiental?

MJAV – Embora não seja obrigatória uma disciplina chamada EA, a inclusão dos temas ligados ao assunto já é obrigatória nas grades curriculares em todas as etapas do ensino no Brasil (fundamental, médio e superior), desde 1999. O que às vezes ainda falta é a preparação adequada do professor – muitos não tiveram contato com o assunto quando de sua formação-, recursos e até mesmo o comprometimento da própria escola para que as ações sejam efetivas. Mas é certo que precisamos investir sempre em educar as pessoas. Somos parte do meio, precisamos dele.
 
JP – Para encerrar, como você vê o meio ambiente de Três Lagoas daqui a 20 anos?

MJAV – A cidade de amanhã depende da que desenharmos hoje. A tendência é o crescimento em população e indústrias e precisamos rigor para que o ganho em empregos e circulação de dinheiro não venha acompanhado das mazelas das cidades grandes. É preciso investir em saneamento, controle industrial, transporte, segurança, educação, saúde, proteção aos rios, córregos e áreas verdes, plantio de árvores na área urbana para contrapor o aquecimento, e cuidados com o trânsito, para que não morramos de acidente ou de nervoso. Qualidade de vida não vem por graça divina e é uma boa causa para se defender.