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Denúncia

Com sequela do "PICC", gestante precisa urgente de cirurgia íntima

Grávida faz parte de estatística onde 45% das mulheres sofrem violência obstétrica no Brasil

45% das gestantes atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), durante o parto são vítimas de maus tratos - Foto: Domínio público
45% das gestantes atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), durante o parto são vítimas de maus tratos - Foto: Domínio público

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Vítima de violência obstétrica após passar por parto normal na Santa Casa da capital em 2015, a atendente Clara Celia Curvo (37), precisa realizar uma cirurgia de reconstrução íntima, devido à uma sequela decorrente do procedimento de “PICC”. “Assim que deitei na maca, a médica plantonista começou a pressionar minha barriga para empurrar o bebê. Estou grávida novamente e fiquei com um queloide que me causa muita dor, tanto que não consigo fazer exames ginecológicos. Só agora descobri que a médica fez uma episiotomia na época”, explica.

Clara está gestante de aproximadamente quatro meses e com medo da história se repetir. Ela tem histórico de má cicatrização e ainda sofre com uma hérnia na região do abdômen. No dia do parto, a médica que fez o toque, a questionou porque sentia dor e gritava.

“Expliquei que tinha endometriose e hérnia. Ela me colocou na cadeira de rodas e me levou para uma sala, depois de ter tirado a acompanhante do local. Gritou comigo, disse que era um favor nunca mais ter filho na Santa Casa. Minha filha nasceu com parada cardiorrespiratória, e tentaram reanima-la por cinco minutos. Só descobri que havia passado pela episiotomia em abril deste ano, quando fui ao ginecologista pra tentar um transvaginal, mas nem isso consigo, porque dói muito”, desabafa.

Ela afirma que ao longo dos anos, a queloide foi ficando mais grave e desde então, tem problemas e dores na relação sexual. “Fui na Santa Casa depois reclamando de dor e ainda fiquei 15 dias no hospital acompanhando minha filha se recuperar. Sentia muita dor na região do procedimento, me deram morfina e fui pra casa. Acabei me separando do marido porque não consegui manter relações sexuais, fora o constrangimento de ir ao médico, porque ficam duas ‘bolas’ no local do corte”, detalha.

Um estudo realizado pelo grupo de pesquisa Saúde da Mulher da Criança e do Adolescente, mostra que no Brasil, 45% das gestantes atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), durante o parto são vítimas de maus tratos. Segundo a defensora pública Thais Dominato, que também atua como coordenadora do Núcleo Institucional de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher (Nudem-MS), existe uma normativa do Ministério da Saúde prevendo quais boas práticas devem ser obedecidas pelos profissionais da área e o que não pode ser praticado em hipótese alguma.

“O procedimento tem que ser justificado e a gestante deve ser informada. Algumas ações não podem ocorrer como, cortar o cordão umbilical imediatamente, só se houver intercorrência e não fazer episiotomia de rotina, apenas se houver necessidade. Não deixar a mulher em posição desconfortável durante o parto. Não ter o acompanhante no pré, durante e pós-parto, o que por lei é garantido à mulher, desde 2005”, afirmou.

Conforme a defensora, há muitos casos onde as gestantes são tratadas com hostilidade e ainda ouvem frases agressivas. “Tratar a mulher de maneira jocosa, dizendo ‘na hora de fazer você não estava gritando desse jeito’, sempre com aquela questão de poder, de hierarquia”, ressaltou. A Defensoria Pública atua no combate à violência obstétrica por meio do Nudem. Em fevereiro deste ano, o núcleo desenvolveu uma cartilha, com objeitvo de esclarecer e principalmente encorajar as mulheres gestantes a resgatarem seu protagonismo e evitarem violências a partir do conhecimento dos seus direitos à assistência humanizada na gestação, parto e pós-parto. Mais informações podem ser obtidas no portal: www.defensoria.ms.gov.br

Questionada pela demora para ir ao médico, Clara disse que ao longo dos anos sentiu muita vergonha ao falar no assunto. Segundo a Santa Casa, a ex-paciente deve ir até uma unidade de saúde mais próxima para fazer exame ginecológico, e dar continuidade no encaminhamento cirúrgico. Thais Dominato explica que é possível acionar a justiça para a tentar a cirurgia de perineoplastia, mesmo com o prazo para ação judicial por danos morais e corporais, expirado (5 anos). “A cirurgia reparadora não tem a ver com a indenização. Teremos que analisar o caso concreto para que ela ingresse com o pedido de cirurgia o mais rápido possível”, reforçou.

Nota da Santa Casa 

“Informamos inicialmente que, de acordo com os registros da Instituição, não há notificação judicial deste caso. No que se refere à situação em questão, foi levantado que a paciente Clara Célia Curvo deu entrada dia 7/9/2015 para parto cesariano, porém a mesma atendia todos os critérios clínicos para o parto normal e assim foi feito. Durante o trabalho, foi necessário fazer uma episiotomia para facilitar a saída do bebê, procedimento padrão em casos de urgência, realizado sem intercorrência.

Após o nascimento, o recém-nascido teve uma intercorrência (parada cardiorrespiratória), mas foi atendido prontamente pela equipe médica e ficou em observação clínica até o momento da alta. Dias depois, a paciente retornou ao hospital, alegando dor em região do procedimento, e foi devidamente tratada e liberada. Levantamos no Serviço de Arquivamento Médico e Estatística (Same), que a paciente em questão fez a solicitação da cópia dos prontuários dela e da filha, que foi entregue em mãos dentro do prazo estipulado (10/8).

Em relação ao procedimento de reconstrução mencionado, trata-se de uma conduta médica que precisa ser avaliada e indicada. Neste caso, ela precisa ir em uma Unidade Básica de Saúde Familiar (UBSF) para ser atendida, inserida no Sistema de Regulação e, posteriormente, encaminhada pela Sesau para uma unidade de atendimento especializado. Vale destacar que a Santa Casa de Campo Grande está à disposição da família para mais esclarecimentos, e que todas as informações relatadas se encontram em prontuário que está sob posse da solicitante”, finaliza o documento.