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Editorial: A lei. Por que a lei?

A lei existe como norma para ser cumprida pela sociedade

A lei existe como norma para ser cumprida pela sociedade. Aliás, é instituída pelos representantes do povo e estabelece nas suas diretrizes as condutas que devem ser observadas pelos cidadãos indistintamente de status social, político e econômico. Não é preciso dizer por que a lei existe para os membros de uma sociedade organizada. Mas é preciso lembrar, sempre, que deve ser obrigatoriamente cumprida, sob pena de seus infratores responderem pelo seu descumprimento. 

A Câmara de Três Lagoas anuncia para hoje o desfecho da apuração de ato de responsabilidade praticada pelo assessor de comunicação da prefeitura, que contratou, com a Câmara Municipal, prestação de serviços com publicações em revista e site na internet de agência de sua propriedade e de familiares. Deliberadamente, descumpriu o Estatuto do Servidor Público Municipal, que proíbe a contratação de qualquer natureza entre servidor municipal com os poderes públicos – Executivo e Legislativo, da municipalidade. É certo que esta proibição visa impedir a obtenção de vantagem em decorrência do exercício da função em que o servidor encontra-se investido. 

A redação do Jornal do Povo recebeu, em caráter reservado, notícia de que a douta Comissão de Constituição e Justiça da Câmara obteve finalmente os documentos que estavam nos arquivos da edilidade, os quais comprovam a contratação do servidor municipal do Poder Executivo com o Legislativo. O veredicto é surpreendente, pois esse servidor, ocupante de cargo em comissão na prefeitura, deverá ser praticamente absolvido da infração que cometeu se devolver os valores recebidos pela prestação dos serviços que indevidamente contratou. 

A lei será remetida para as calendas gregas, relegada. Não deverá ser aplicada nenhuma penalidade. Diante desta constatação, verifica-se que, para cada caso, há uma interpretação de acordo com a necessidade de não se imputar os seus efeitos aos graúdos da administração municipal. Concluir-se-á que não houve ato infracional e, consequentemente, o infrator ficará impune. 

Certamente, não é desta maneira que as pessoas de bem vêm a interpretação da lei, que claramente estabelece proibições e penalidades. É certo que a legislação deve e precisa ser cumprida para não relegar a segundo plano os seus efeitos e muito menos, animar a prática infracional por gente que pensa que está acima da lei e das pessoas. 

Há de se lembrar que certa feita houve um precedente de fato duvidoso que não foi apurado convenientemente. Lembra-se de quando a Câmara contratou empresa de fundo de quintal para locar automóveis de luxo que eram colocados à disposição dos nobres vereadores. 

Diante da suspensão do contrato denunciado, o Ministério Público Estadual considerou cessada a irregularidade e “tudo ficou com antes na terra de Abrantes”. Ninguém foi punido diante da contratação duvidosa nem houve apuração aprofundada sobre o caso. Aliás, o contrato tornou-se regular. Enfim, ficou o dito pelo não dito. 

Agora, neste rumoroso desrespeito ao estatuto, pretendem dar a mesma solução. O servidor que contratou com irregularidade serviços no Poder Legislativo deverá ser penalizado com a devolução de valores que recebeu indevidamente. E, como consequência, farão de conta que não houve transgressão à norma pública. Assim, o assessor de imprensa que está acima da lei, continuará, exercendo suas funções na prefeitura de Três Lagoas, mansa e pacificamente. 

Fechando com chave de ouro esse fato, pretende a Comissão  de Constituição e Justiça da Câmara conceder certidão de probidade administrativa para este servidor. Não se sabe qual a interpretação que a administração municipal, que tem a obrigação de fazer valer a lei, ou seja, o estatuto, dará a esta conclusão, que mais está para acabar em pizza do que fazer valer a lei. 

Embora tenham armado tudo de acordo com as conveniências para um resultado feliz, certamente, esqueceram de consultar a Corregedoria do Ministério Público Estadual de Mato Grosso do Sul, que determinou o acompanhamento desta apuração, para, ao seu final, concluir o seu próprio juízo de valor e dar a sua interpretação, que, inexoravelmente, deverá ser bem diferente da conclusão dos nobres vereadores.