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EDITORIAL: A terra da esperança

Engana-se, quem pensa que estas pessoas estão nas ruas da cidade em situação de dificuldade

Recentemente, o Jornal do Povo publicou editorial alertando para o risco de propaganda sobre Três Lagoas que a apresenta como a “terra prometida” para quem busca empregos e melhoria na qualidade de vida.

Nas últimas semanas, o Centro Integrado de Apoio ao Trabalhador (Ciat) de Três Lagoas, registrou aumento considerável no atendimento à trabalhadores vindos de outras regiões. Essa corrida pelo emprego já era esperada, ainda mais, quando estatísticas do próprio governo federal apontam elevado índice de desemprego que indica que mais de 8,2 milhões de brasileiros estão desempregados. Neste momento quando ronda a possibilidade de crescer mais ainda o desemprego, nós de Três Lagoas estamos exultantes com o anúncio da expansão duas grandes fábricas de celulose, as quais irão gerar milhares de empregos durante os próximos dois anos, enquanto durar a fase de construção civil destas indústrias.

Mas, diante desta procura que varia entre 300 e 350 pessoas por dia, outra questão preocupa, enquanto as vagas de empregos não se abrem. Trata-se da questão social, porque ao mesmo tempo em que aumenta a procura por emprego, cresce, paralelamente, o número de pessoas em situação de rua em Três Lagoas.

Engana-se, quem pensa que estas pessoas estão nas ruas da cidade em situação de dificuldade, são pessoas que vivem na mendicância. Não, não são.  São trabalhadores que vieram para Três Lagoas  buscar oportunidade de trabalho e ficaram sem quaisquer meios de subsistência até porque não tinham opção para voltar às suas origens, porque estão desprovidas de recursos financeiros. Vieram para cá, quase na certeza de que obteriam emprego imediatamente diante do anúncio de construção para a ampliação destas duas fábricas de celulose.  Estas pessoas têm carteira de trabalho, as quais atestam o último emprego que perderam por causa da crise econômica ou, porque onde trabalhavam a obra foi concluída e não conseguiram, depois, diante da paralisia que assola o país, outro emprego. Vieram para Três Lagoas em busca do tão sonhado emprego, porque foram anunciados estes empreendimentos, os quais realmente fazem diferença se comparados ao resto do país. Que cidade como a nossa que na atualidade tem perspectiva de receber mais de 16 bilhões de reais em investimentos em um lapso de dois anos. Quase nenhuma, para dizer, que não se tem notícia de alguma. Mas, o fato é que estas pessoas vieram atraídas exatamente pela propaganda ufanista de todos nós que acreditamos piamente de que aqui a crise não prejudicará o desenvolvimento do comércio local e nas possibilidades de prosperidade. Certamente, se não houver mudanças de propósitos na execução destes dois grandes projetos, Três Lagoas estará vacinada contra o desemprego.  

É certo que a paralisação das obras da fábrica de fertilizantes da Petrobras gerou forte impacto na economia local, além de ter causado um calote milionário, sem precedentes, dado pelas empreiteiras responsáveis na execução de sua construção. Repentinamente, milhares de trabalhadores ficaram sem emprego. A maioria deles, de outros estados, e, o mais grave, sem o pagamento de seus direitos trabalhistas para que pudessem, ao menos, retornar para casa.

A Justiça do Trabalho interviu mostrando que sabe ser eficiente na defesa dos direitos do trabalhador. Bloqueio dinheiro e bens das empresas responsáveis pelo Consórcio da UFN- III  e da Petrobras para garantir o pagamento de todos os direitos trabalhistas. Entretanto muitos operários optaram por permanecer em Três Lagoas na esperança de conseguir emprego em outra empresa, talvez, até em outra atividade ocupacional. No entanto, aliada à paralisação a obra, eclodiu esta crise econômica que o país há muito tempo não vivi. A indústria local,  passou a demitir ao invés de contratar.

Embora distante da realidade de muitos três-lagoenses, esse impacto pode ser medido em números de atendimentos feitos pela Unidade de Acolhimento para Adultos e Famílias de Três Lagoas, o antigo Albergue Municipal. No ano passado, de janeiro a dezembro, 300 pessoas passaram pela unidade. Neste ano, o índice saltou para quase mil pessoas, somente nos cinco primeiros meses do ano.

Tais números reascendem uma preocupação antiga quanto ao futuro de Três Lagoas. Embora a estrutura tenha sido suficiente para dar suporte a esses migrantes, seria a cidade capaz de comportar uma grande leva migratória e desempregada?  Suportaria os efeitos sociais que envolvem assistência social, entre outras demandas.

É claro que Três Lagoas tem uma boa estrutura para enfrentar essas adversidades, entretanto, essa causa, certamente, onera o poder público, que está obrigado a prestar assistência á cidadãos brasileiros que buscam a cidade tida e havida na atualidade como uma “terra prometida”.  Essa constatação deve servir como sinal de alerta,  embora, ainda pequeno, para que a cidade não seja vista como um “o conto de fadas  e  não se torne uma fábula perversa”, como alertou, há muitos anos, uma professora da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), doutora em geografia. Essa frase foi dita durante o processo de discussão a construção do então complexo de papel e celulose da antiga VCP, hoje Fibria e International Paper. A história se repete agora com a ampliação das duas fábricas de celulose. Espera-se, porém, que  os problemas sociais não sejam os mesmos, considerando-se as experiências anteriores e as cautelas que o momento econômico recomenda.