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Reportagem

'Mudança resgata dignidade sexual', diz delegada

Delegada da Mulher, Eva Maira Cogo, aponta endurecimento de pena e tipificação de crime como pontos positivos em lei

O dia 24 de setembro de 2018 certamente ficará marcado na história do direito brasileiro pela alteração da lei de crimes contra a dignidade sexual. A discussão ganhou força após Diego Ferreira de Novais, de 29 anos, ter sido preso, solto e preso novamente, na mesma semana, por ejacular em uma passageira e se esfregar em outra, dentro de um ônibus, na capital paulista, em setembro de 2017. Membros do Poder Judiciário, ativistas e a população se dividiram: crime de estupro ou mera importunação? Ele devia ou não ser mantido preso? Tratava-se de mais um atentado à liberdade sexual de uma mulher, semelhante aos que acontecem quase que diariamente, quando estão a caminho de casa, da escola ou do trabalho.

Com a nova regra, que altera o Código Penal, define no artigo 215-A como tipo penal da importunação sexual: praticar contra alguém e sem a sua anuência, ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro: Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o ato não constitui crime mais grave. Para a delegada da Mulher, Eva Maira Cogo, de Paranaíba, a mudança dá suporte para o enquadramento de casos semelhantes. 
“Muitas vezes, nós, operadores do direito, delegados, promotores, juízes, ficávamos de mãos atadas diante das situações, com a criação do crime de importunação sexual vai auxiliar muito nossos trabalhos”, disse. 

Jornal do Povo – Em casos como os de Diego, os criminosos serão alcançados pelo novo dispositivo? 

Maira – Recentes casos de indivíduos que abordam mulheres na rua e se masturbam, a partir de agora, entram sim no quesito de importunação sexual, porque, antes da lei de setembro, era tipificado apenas como contravenção penal e a pena máxima era multa; o autor era preso, assinava um termo de compromisso na delegacia e era liberado.

JP – E agora, o que acontece com esse autor?

Maira – Se for pego em flagrante será preso e a pena passou de um para cinco anos. É uma alteração muito importante porque dá respaldo à população e aos profissionais do direito, para podermos atuar frente a casos assim. 

JP – Qual sua opinião quanto a pena?

Maira – Digna, porque já tivemos vários casos em que a mulher foi tocada, mas como não houve grave ameaça, não tinha dispositivo legal para se enquadrar. 

JP – Quais foram as mudanças em caso de divulgação de imagens íntimas? 

Maira – Agora, o indivíduo que repassa, distribui cenas de estupro, estupro de vulnerável, cenas de pornografia, sexo ou que divulga foto nua de pessoa, porque a lei não é apenas para mulheres, mas para homens também, embora a gente registre a maioria dos casos envolvendo mulheres. A pena também é de um a cinco anos. Esses casos acontecem muito, principalmente de ex-namorados, ex-maridos, em que a mulher confia de passar uma foto nua e, após o término do relacionamento, por vingança, o ex publica. Antes dessa lei, nós fazíamos um "contorcionismo jurídico" para conseguir enquadramento em um delito de injúria.

JP – Qual outra mudança poderia ser classificada como um avanço?

Maira – A lei deixou muito clara a questão do estupro de vulnerável, que é manter relação sexual ou ato libidinoso com menor de 14 anos. Acontecia em muitos casos que um homem maior engravidava uma menina menor de 14 anos, mas, na delegacia, ele justificava que a menor quis engravidar e que os pais [dela] sabiam. Isso, agora, foi derrubado. Independentemente da vítima já ter tido relação sexual anterior ao crime ou houver consentimento, será enquadrado como estupro de vulnerável, passível de punição.