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Violência afeta quatro mulheres por dia em TL

Mais de 70% não levam a denúncia adiante e desistem do processo antes do término

Três Lagoas é uma das 11 Delegacias Regionais que mais registra denúncias de violência doméstica no Estado, perdendo apenas para Campo Grande e podendo ser equiparada a Dourados. Somente em 2007, foram registrados 1.057 casos, em 2008 o número subiu para 1.267 e até o dia 8 de setembro, o volume já era de 823. Só em agosto, 44 processos foram concluídos e encaminhados à justiça.

A média de denúncias registradas na Delegacia de Atendimento à Mulher (DAM) fica em 120 registros mensais. De acordo com o delegado, Alberto Cézar Batista Vieira, este número nunca é menor que 100. Para ele, um dos fatores responsáveis pelo aumento do volume de acusações contra a violência doméstica, é a imposição da Lei Maria da Penha.

A regra que alterou o Código Penal em setembro de 2006, três anos atrás deve ser considerada uma conquista feminina. “Como a lei é nova a tendência é que cada vez mais mulheres procurem o atendimento. Elas têm denunciado sim, e é necessário que estejam cientes dos seus direitos”, comenta.

A medida permite, por exemplo, que os agressores sejam presos em flagrante ou tenham a prisão preventiva decretada. Alberto lembra que a violência doméstica não está destinada apenas às pessoas mais carentes. “Ela não tem cara, nem nível social. Não está estampada na cor, no credo, nem na situação socioeconômica”, lembra.

Entre os motivos que mais provocam denúncias de ameaça e agressão estão em primeiro lugar o alcoolismo, seguido pelo ciúme. “Os motivos muitas vezes são banais. Mas acabam em agressão. Geralmente a quantidade de denuncias aumenta em períodos de férias e a violência não se restringe a marido e mulher, acaba envolvendo toda a família, como cunhados, irmão, entre outros”.

N.F.O, de 29 anos é um das centenas de vítimas que relatam agressões sofridas diariamente. A vítima foi agredida no último dia (9) pelo ex-marido, L.R.P, 27 anos.

A briga começou quando o ex-marido foi até sua residência para pegar um aparelho de som, mas eles se desentenderam e L.P.R  agrediu a ex-esposa com socos e pontapés. Além do emocional, a briga trouxe ferimentos externos, pois com um pedaço de ferro o homem atingiu os lábios e o rosto da vítima.
Após denúncia o autor foi detido e encaminhado à delegacia. Ele cumpre pena no regime semi-aberto pela prática de furto.

Muitas mulheres desistem de levar o processo adiante por medo. O delegado relata que muitas se sentem fragilizadas, tem filhos pequenos e o sustento vem do marido. “A maioria não tem profissão, ou ainda uma capacitação para se manter após a separação. Elas fazem a denúncia, instaura-se um procedimento e no decorrer acaba desistindo”.

Hoje em dia, a violência não é denunciada apenas pela vítima, parentes, amigos e até mesmo os vizinhos podem procurar ajuda.
 
APOIO

Três Lagoas ainda não possui um abrigo para as mulheres e segundo Alberto, essa é uma das questões que deveria ser colocada como prioridade. “Nós precisamos de uma casa de abrigo para estas mulheres. É essencial, já que ela faz a acusação. O acusado pode ser preso, mas se paga fiança é solto e ao voltar para a casa a violência pode ser pior. Muitas não tem família aqui, são de outras regiões. Não temos espaço, mas já há um encaminhamento para que o problema seja resolvido”.

Antes da Lei Maria da Penha, as mulheres reclamavam que pouco adiantava denunciar o marido agressor; elas iam até a delegacia, narravam a violência e, ao retornar para a casa, apanhavam de novo. “Com a lei muita coisa mudou. Antes a mulher se humilhava, denunciava o marido e tudo que acontecia como punição era o pagamento de cestas básicas. Agora isso mudou. Ela não precisa mais ir à frente de um juiz depois de ser agredida e saber que a única punição será o pagamento de cestas”.

Um caso clássico e recente do uso da Lei Maria da Penha, é o de Luana Piovani e Dado Dolabella. “O ator não respeitou a lei e foi preso”, lembra o delegado.

O número de renuncia ao direito de representação ainda é uma questão que preocupa. Em Três Lagoas a desistência chega a 70%, e o índice está longe do ideal. “Bom mesmo seria se elas não desistissem. Essa ação só gera o fomento de mais violência. É a sensação de impunidade que fica”.

O delegado relata que muitas vão à delegacia no calor da discussão, agoniadas por terem sofrido agressão e que com o tempo elas desistem de levar o processo adiante. “Acredito que tudo isso seja uma questão cultural. É uma lei muito moderna, e as mulheres não têm consciência da importância dela. Não é apenas as menos aculturadas, quem tem boa situação também registra, mas desiste. O que prevalece é o interesse econômico”.

A lei funciona e depende mais das mulheres leva a situação adiante para que o direito seja efetivado.

MARIA DA PENHA

A Lei Maria da Penha, imposta desde setembro de 2006, é uma é uma homenagem a uma militante dos direitos das mulheres, vítima de dois atentados de homicídio.

Maria da Penha sofreu a primeira violência por meio de arma de fogo, que a deixou paraplégica, e o segundo,  choque e afogamento.

O caso de Maria da Penha chegou à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, organismo que culpou o Brasil por negligência e omissão em relação à violência doméstica. O ex-marido de Penha foi preso, mas por apenas dois anos, e hoje vive em liberdade.