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JABUTIS NO GALHO

Alexandre Garcia

Ainda lembro os tempos de inflação a 5000% ao ano, com Funaro congelando os preços e os fiscais do Sarney nas ruas, a prender “especuladores”,  sem mandado judicial. Lembro daqueles tempos – hoje venezuelanos – de prateleiras vazias e de polícia entrando nos pastos para prender boi gordo. E ainda testemunhei Plano Bresser, Plano Verão. E o maluco Plano Collor, em que o Antônio Ermírio de Moraes e eu dispúnhamos no banco do mesmo limite de $50,00 cruzados  – socialismo é isso aí. Também lembro quando o presidente Itamar me ligou e me passou o furo do real, que logo deixou de ser plano para ser cotidiano e ninguém mais ouviu falar em hiperinflação nesses últimos 25 anos.

            Mais atrás no tempo, lembro de quando um colega de ginasial me pediu emprestado o relógio Roamer que eu havia ganho de minha tia. Ele demorou dias sem devolver e fui à casa dele, saber o que acontecia. Era filho do sapateiro e o quarto dele ficava logo atrás da oficina do pai. Fui entrando, como fazia sempre e encontrei uma surpresa sobre a escrivaninha de meu amigo João Carlos: meu relógio havia sido desmontado e ele não sabia como remontar. A lembrança veio para comparar  com o que o governo tem feito hoje com o relógio que recebeu funcionando. Mexeram na engrenagem mais sensível do relógio da economia: o preço da energia – justo o ponto em que a presidente teria fama de entender.

            Já apequenaram a Petrobras e a Eletrobrás. O aparelhamento partidário levou a nossa petroleira às páginas policiais. É a denúncia de propina na Holanda,  compra superfaturada da refinaria no Texas, as maquiagens contábeis. A atual presidente da estatal já recebeu assim o abacaxi. É a empresa mais endividada do mundo; neste ano, importa 60 mil barris de gasolina por dia e 160 mil barris/dia de diesel. O governo procura empurrar  as conseqüências para depois da eleição, como manda o conselheiro-mor da presidência, que é o Marqueteiro-Geral da República. O objetivo é manter o poder a qualquer custo – desde que não seja custo eleitoral para o governo. O contribuinte paga. Paga imposto, paga bolsa-família, paga déficit. E a presidente será reeleita.

            Ainda que haja algum tropeço no caminho e que apareça alguma alternativa que conquiste o povo das bolsas, a partir de 1º

  de janeiro vamos todos ter que carregar pedras morro acima. Se ganhar o governo, a oposição vai dizer “bem-feito., vai colher o que semeou”.  Se a oposição por acaso ganhar, os atuais governistas vão dizer, ante o caos do ano que vem:  “eu não disse?”. Porque  a nação inteira vai pagar as conseqüências do desmonte do relógio da economia, do aparelhamento partidário do estado, do pesadelo resultante do sonho ideológico que não deu certo em lugar algum do planeta. Mas não joguem a culpa só nos políticos. Se jabutis estão no galho, foi porque alguém os pôs lá.