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Três Lagoas

?A saúde é a angústia da população?

Entrevista com José Carlos Rezende Pereira - Diretor Técnico do Hospital Auxiliadora

O médico José Carlos Rezende Pereira, especializado em Cirurgia Geral e Videolaparoscopia, tem 30 anos de profissão, sendo que 28 anos atuou no Rio de Janeiro. Resolveu trocar a “cidade grande” por Três Lagoas em busca de qualidade de vida. Ocupa o cargo de diretor técnico do Hospital Nossa Senhora Auxiliadora e atua também como médico na Secretaria Municipal de Saúde.

Residindo há apenas dois anos na Cidade, ele revela que uma das coisas que mais chama a atenção é o fato que 92% dos três-lagoenses utilizam os serviços públicos de saúde. Ele afirma que a saúde é a angústia da população.

“O que acontece é que a medicina vem cada vez mais melhorando e a informação cada vez é mais fácil. As pessoas ficam sabendo de determinadas coisas que ainda não existe em Três Lagoas e ficam cobrando, mas infelizmente o mundo é capitalista e o sistema é capitalista. Tem determinadas coisas que dependem para funcionar que você tenha algum retorno. É o caso do serviço de ressonância magnética”, exemplificou.

Jornal do Povo – Porque o senhor resolveu deixar o Rio de Janeiro e atuar aqui em Três Lagoas?

José Carlos Rezende Pereira – Por gostar da Cidade e por buscar melhor qualidade de vida. Uma vida com melhores valores. Posso acordar mais tarde, almoço em casa, coisa que eu nunca tive o direito de fazer nos meus 28 anos que atuei no Rio de Janeiro. Consigo tirar um cochilo, após a refeição. Sempre estou mais cedo em casa. Enfim aqui eu levo uma vida mais saudável. O Rio de Janeiro a violência é muito mais naquele trânsito, o fato de todo dia você ter que levar horas para se deslocar de um lugar para outro. Aqui se tem mais tempo para você. Enfim uma vida que você pode viver mais.

JP – O senhor ocupa um cargo de diretor técnico do Hospital Nossa Senhora Auxiliadora. Hoje ainda é problemático administrar os recursos recebidos do SUS?

JCRP – Hoje em Três Lagoas está cada vez mais fácil administrar esses recursos, porque está havendo uma boa relação entre a Secretaria Municipal de Saúde e o hospital. Esta relação de verba do hospital está avançando muito. Teve uma  reunião da conta atualização há dois anos. Foi a primeira no Brasil todo. Mudou a forma de financiamento do SUS, dos hospitais públicos, porque antigamente era por procedimento e agora e hoje é conta atualização. A prefeitura, por exemplo, que tem gestão plena, faz avaliação quantitativa e qualitativa do atendimento e a remuneração proposta recebe uma pontuação. Dentro destes códigos você pode receber mais ou menos daqueles valores acertados. Se você não conseguir atingir sua meta, você recebe menos.

JP – O problema da saúde em Três Lagoas é como se fosse uma “ferida” facilmente tratada em um ambulatório ou precisaria de uma cirurgia mais delicada?

JCRP – Três Lagoas é uma cidade de pequeno porte. Tem menos de 100 mil habitantes. Tem um sistema de saúde pequeno, mas que nesses dois anos eu vi que melhorou. Tem novos profissionais, tem novas especialidades. Três Lagoas tem uma característica especial que é o fato de 92% da população utilizar o sistema público de saúde, só 8% tem plano de saúde. Em Niterói, por exemplo, 42% tem plano de saúde. Ainda dependemos muito de Campo Grande, envolvendo as grandes especialidades. Muitas especialidades a Cidade já conta. Eu acho que em Três Lagoas é uma ferida de ambulatório. O hospital, por exemplo, vem melhorando, qualificando seus profissionais.

JP – Fiz uma entrevista recente com a prefeita Simone em que ela disse que enquanto o financiamento do SUS continuar do jeito que é, nenhum gênio vai conseguir melhorar a saúde, o senhor concorda com essa declaração?

JCRP – Eu concordo. Porque a saúde é a angústia da população. Existe uma demanda muito grande pelos serviços. O que acontece é que a medicina vem cada vez mais melhorando e a informação cada vez é mais fácil. As pessoas ficam sabendo de determinadas coisas que ainda não existe em Três Lagoas e ficam cobrando, mas infelizmente o mundo é capitalista e o sistema é capitalista. Tem determinadas coisas que dependem para funcionar que você tenha algum retorno. É o caso do serviço de ressonância magnética. Talvez, agora, considerando a região do Bolsão já comece a pedir por esse serviço, mas antes não cabia em Três Lagoas. Hoje, por exemplo, o hospital está instalando uma tomografia mais moderna, com excelente imagem, com um excelente profissional, garantindo uma qualidade de imagem e uma qualidade de laudo. Essa qualificação Três Lagoas está ganhando aos poucos. Daqui a pouco a ressonância vai chegar. Ou seja, essa tecnologia vai chegando, mas para colocar ela a serviço da população depende de demanda. Isso vai chegando aos poucos.

JP – Falando sobre o problema mais recente. Teve médicos que ficaram assustados com a Gripe Suína. Como o senhor está vendo essa questão. É mais pânico da população do que realidade?

JCRP – Aqui a gente começou a ver umas quatro semanas atrás as pessoas procurarem pelo atendimento relacionado com essa doença, por causa das informações divulgadas pela imprensa. E realmente, até agora, a gente não está vendo nada que assuste. No hospital, das pessoas que foram atendidas apenas seis precisaram receber tratamento na ala de isolamento. Até ontem [7] havia apenas um menino, que acabou sendo liberado. Destes, seis receberam tratamento contra a Gripe e foi colhido material para exame, ocorreu apenas um óbito suspeito.

JP – Como está a realidade de UTIs em Três Lagoas

JCRP – Nós contamos no hospital com 10 leitos de CTI. É um bom número comparado com a realidade dos demais hospitais brasileiros. Aqui temos um número compatível com o tamanho da cidade de Três Lagoas, talvez não seja ideal para atender a demanda do Bolsão. São 10 leitos novos, com um profissional especializado em Medicina Intensiva, que hoje dirige o CTI do Hospital. O índice de fatalidade caiu muito. Uma deficiência de Três Lagoas, exatamente por ser uma cidade de nível médio, é falta de sala de cirurgia pediátrica, de uma UTI Pediátrica e UTI Neo-Natal. O grande problema é falta de profissionais que atuem nessa área. Campo Grande tem 13 cirurgiões pediatras. Então é complicado. Essas especialidades realmente têm um número menor de profissionais. Interiorizar esses profissionais é complicado, porque demanda um salário maior, porque ele vai trocar um hospital maior, com mais recursos, por uma cidade menor, com menos recursos. Você só consegue montar um centro cirúrgico pediátrico se você tiver número de profissionais suficientes. Por isso que estou falando que dentro do porte de Três Lagoas é problemático. Campo Grande, por exemplo, tem 700 mil habitantes e três hospitais grandes, mas tem uma enorme dificuldade de determinados profissionais. Filas em cirurgias eletivas, problemas de remuneração dos profissionais. E olha que é uma cidade que tem Universidade de Medicina, o que ajuda muito. Os acadêmicos, de uma maneira ou outra, somam com o atendimento à população. No interior tudo isso fica mais difícil. A relação de trabalho em um país capitalista, para você trazer um profissional, você tem que oferecer alguma coisa. Esse alguma coisa é uma remuneração melhor.

JP – Mas afinal, ocorreu alguma evolução nesse sentido aqui na Cidade?

JCRP – Vi evolução sim nesses dois anos que estou aqui. Chegaram médicos oncologistas, hematologistas, cirurgião oncológico, anestesistas, urologista, endocronologista, dermatologista, enfim, estão começando a vir especialidades que a Cidade não contava. Isso diminui a angústia da população. Eu acredito realmente que a gente vai caminhar para uma qualidade desejável, fazendo com que Três Lagoas seja referência do Bolsão. E que a população não pense que o ônibus seja o melhor caminho para quem precisa de médico.