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Três Lagoas

"Sindicatos não devem só lutar por melhores salários"

Esta é a visão do presidente do Sindicato dos Empregados no Comércio de Três Lagoas

Cada vez mais, as atividades do trabalhador do comércio exigem, a cada dia, aprimoramento de suas funções, que não podem mais estar somente associadas ao amadorismo e a experiências adquiridas, que resultaram no passado em sucessos de vendas. Hoje, esses vendedores, tidos, até há bem pouco tempo, como “campeões de vendas” serão simplesmente marginalizados e até descartados pelas grandes e médias lojas, se não se alinharem às novas técnicas de vendas e abordagens do cliente. A profissão de vendedor não pode ser encarada como atividade transitória de alguém que não consegue espaço em outra profissão e está nesse emprego como “passagem” para uma outra, quando logo surgir a oportunidade. É importante acabar, ou ao menos, tentar diminuir a rotatividade do vendedor no comércio.

É essa a visão do presidente do Sindicato dos Empregados no Comércio de Três Lagoas, Eurides Silveira de Freitas (48), entrevistado do Jornal do Povo, nesta semana. Segundo ele, a atividade sindical é ampla e não pode apenas restringir-se à reivindicação por melhores salários, em uma determinada data de cada ano.

Há mais de 10 anos na atividade sindical, Eurides trabalha desde os 16 anos de idade, desde o tempo em que a Viação Aérea de São Paulo (Vasp) possuía escritório em Três Lagoas, na década de 1970. Desde essa época, sempre exerceu funções ligadas ao comércio.

JP: Desde quando você está ligado diretamente à atividade sindical?

Eurides: Fui convidado, há pouco mais de 10 anos para participar da diretoria do Sindicato dos Empregados no Comércio de Três Lagoas. Exerço atividades no setor do comércio, desde os 16 anos, quando trabalhei na Vasp (Viação Aérea de São Paulo), depois no Cartório do 3º Ofício, na Distribuidora Brahma e outros. Como presidente do Sindicato, desde 1999.

JP: Você foi eleito presidente, numa época em que o Sindicato da categoria atravessava uma dura fase, decorrente de sérios problemas internos e total falta de credibilidade. Como você enfrentou tudo isso?

Eurides: Não foi nada fácil. Além da total desestruturação interna, o Sindicato dos Trabalhadores no Comércio, que mantinha uma série de convênios com várias lojas do próprio comércio, perdeu a credibilidade. Houve problemas de desvio de dinheiro e outras questões que foram parar na Justiça. Só sei que demoramos uns sete a oito anos para nos levantarmos desse rombo e, principalmente, recuperarmos a credibilidade de uma entidade séria e respeitável.

JP: O que foi feito para levantar “a moral” do Sindicato?

Eurides: Diante de tantos problemas, que exigiam tempo para ser solucionados, chegamos até a receber conselhos de amigos para desistirmos, mas fomos adiante. A primeira medida que adotamos foi inovarmos no nosso trabalho e encararmos o sindicato como uma empresa, quase falida, sem crédito no mercado e, o pior, sem moral perante a maioria dos trabalhadores da nossa categoria. Acertamos nessa visão e as coisas começaram a melhorar. Ainda cursando a Faculdade de História e pós-graduação em Administração, comecei a ver o Sindicato como empresa, que precisávamos administrar bem. Para tanto, eu precisei preparar-me e fiz diversos cursos no Sebrae, com esse intuito, como Sebrae Ideal e Empretec. Esses dois cursos e outros me abriram novos horizontes.

JP: Por que o Sindicato também é uma empresa?

Eurides: Muita gente pensa que a atividade sindical se restringe às reivindicações, lutas e discussões sobre ajustes e reajustes salariais, em tempo de dissídio coletivo, para garantir salários justos para a categoria. Não é só isso. Assim como qualquer loja de comércio tem o seu produto para vendê-lo, a nossa maior preocupação é o trabalhador. Ele é a principal razão do Sindicato. Para tanto, nos propomos a marcar presença e estamos envolvidos em todos os setores, conselhos municipais, representando os trabalhadores. Isso tem sido muito importante. Tem sindicalista que não quer saber quem morreu, ele quer é somente chorar para chamar atenção.

JP: Como está hoje estruturado o Sindicato dos Trabalhadores no Comércio?

Eurides: Hoje estamos instalados em sede própria da Federação dos Trabalhadores no Comércio de Mato Grosso do Sul (Fetracom/MS) e não pagamos mais aluguel. Temos um Departamento Jurídico e atendimento agendado ao trabalhador diariamente. Não atendemos somente ao trabalhador da nossa categoria, mas a todos indistintamente, que precisam dos nossos serviços. A área de atendimento é aberta e não restrita, como o que existe em alguns outros sindicatos. Infelizmente, hoje existem muitos sindicatos em Três Lagoas, mas poucos são estruturados para prestar assistência e atendimento ao trabalhador. Por essa razão, cedemos o espaço e até nossa estrutura também a outras categorias que precisarem. Essa é a nossa visão comercial. Se todas as categorias de trabalhadores estiverem bem, a do comércio também irá bem.

JP: Como funciona isso na prática?

Eurides: Vou dar um exemplo: quando o Sindicato se mobilizou para promover cursos de cabeleireiro, manicuro e pedicuro e outros, várias pessoas acharam isso muito estranho e nos questionavam sobre o que tínhamos a ver com isso. Em curto espaço de tempo, foram abertos em Três Lagoas, cerca de 50 salões de cabeleireiro. Com isso, aumentaram as vendas no comércio, especialmente, no setor de cosméticos. No final de um dos cursos, uma senhora contou que estava há tempos desempregada e não tinha dinheiro nem para comprar pão e leite para os filhos. O curso nem havia terminado e ela já havia conseguido clientela e agora tinha dinheiro para o pão e o leite e podia comprar outras coisas para a sua casa e o sustento de sua família. Por isso, acredito que tudo o que se faz para melhorar a Cidade reverte para a melhoria do comércio e dos que trabalham como vendedores.  

JP: Quantos trabalhadores do comércio são sindicalizados?

Eurides: O comércio de Três Lagoas ainda é o que mais emprega. No entanto, temos uma variação de 500 a 700 trabalhadores sindicalizados. Infelizmente, ainda é muito alto o índice de rotatividade do emprego no comércio. Uma grande maioria trabalha no comércio, como profissão provisória, enquanto se prepara para outra profissão ou até concurso público. São poucos aqueles que abraçam a profissão definitivamente e procuram se aprimorar para isso. Alguns se limitam a cumprir horário, outros possuem realmente talento e carisma para as vendas e, com isso, são bem sucedidos na sua profissão.

JP: Como é um trabalhador bem sucedido no comércio?

Eurides: Para ser bom vendedor, o trabalhador tem que estar sempre atualizado e se aprimorando através de cursos, que lhe são oferecidos. Não é só vender, ele tem que saber o que está vendendo. Ao contrário do que alguns pensam, trabalhar no comércio não é um trabalho repetitivo. Cada freguês exige postura e comportamento diferenciados. Não basta possuir só talento e conhecer técnicas de venda, o trabalhador do comércio tem que ter carisma para conquistar amizades, ouvir muitas histórias e até confidências para manter clientes fiéis. Os que não possuem isso acabam saindo. Os bons permanecem, fazem carreira e têm sucesso.

JP: Com têm sido o seu desempenho, nas reuniões de negociação de reajuste salarial da classe que você representa?

Eurides: O meu papel, como sindicalista, no caso, presidente de um Sindicato, não deve ser apenas discutir salário e jornada de trabalho, mas dar todo o amparo e apoio ao trabalhador. Se fosse só isso, facilmente ficaria de braços cruzados. Temos que acompanhar tudo o que se refere ao trabalhador. Por essa razão, estamos constantemente em Brasília. É lá que são elaboradas e aprovadas as leis que beneficiam ou prejudicam o trabalhador.
Quanto ao piso salarial, em Três Lagoas, vivemos uma situação especial, porque o salário do trabalhador do comércio transformou-se em referência para a negociação de outras categorias, inclusive a dos trabalhadores da indústria. Não temos outro teto salarial, como referência. Em outros Estados é diferente, não existe a comparação com o trabalhador do comércio. Isso nos coloca em situação difícil. O piso salarial do comércio é de R$ 510, acima do trabalhador da indústria e do salário mínimo, que é de R$ 465. Quando conquistamos reajuste, outras categorias de trabalhadores usam o nosso piso como referência.