Veículos de Comunicação

Três Lagoas

?Vamos correr atrás do sonho?

A entrevista da semana é com o professor Reynaldo Abrão Camargo

O professor Reynaldo Abrão Camargo tem 43 anos, nascido e criado em Três Lagoas, formou-se em Educação Física em 1989 em Andradina (SP) na Fundação Educacional de Andradina (FEA). Trabalhando na Secretaria de Juventude, Esporte e Lazer (Sejuvel) há 24 anos, começou como estagiário e entrou para o atletismo em 1995 tanto no masculino, como no feminino. Em 1997 fixou-se no feminino e foi também atleta do esporte. “Com 14, 15 anos corria os 200 e 400 metros, os revezamentos 4X100 e 4X400. Cheguei a ser recordista no Estado nos 400 metros e no revezamento 4X100”, contou o professor durante a entrevista. Reynaldo Abrão se tornou ao longo dos anos uma figura importante em Três Lagoas. O trabalho sério à frente do atletismo vem rendendo frutos. Atletas sob o comando dele, estão em alto nível e conquistam medalhas locais, estaduais, nacionais e internacionais. A mais nova revelação é a atleta Luana Paula Pereira Braga. Ela disputa e vence quase todas as competições do salto triplo, mas passou por dificuldades financeiras e quase abandonou o esporte. O sonho do professor é criar uma associação, um pólo de treinamento para o atletismo em Três Lagoas.

Jornal do Povo: Como você avalia o atletismo em Três Lagoas?

Reynaldo Abrão Camargo: Hoje ele está crescendo bastante. Tanto é que, desde 2000 para cá, temos colocado atletas em campeonatos brasileiros e até mesmo em Seleção Brasileira. Formamos medalhistas nacionais e até internacionais.

JP: O atletismo é vasto. Para praticá-lo, pelo menos o básico como correr, não precisa gastar muito. Por que ele não consegue se tornar um esporte de massa no País?

Reynaldo: Como o atletismo é um esporte individual, é um pouco mais difícil. Embora seja considerado um esporte de classe média baixa, os materiais do esporte são caros. Por exemplo, dardo, sapatilhas ou tênis para competir de marca, têm valores consideráveis. Mas em questão de popularidade, até que é bem praticado. Até porque ele pode ser praticado em qualquer lugar, não precisa estar em uma pista de atletismo para iniciar-se no esporte. A pessoa pode estar no campo, na quadra, na rua e pode fazer atividades relacionadas ao atletismo. A criança em si, quando se fala em atletismo, pensa que só vai correr. É diferente do voleibol, do futebol. Mas o atletismo não tem recreação, praticamente é só treinamento. Por isso que as crianças dizem não ao esporte. Realmente é cansativo. Só participa mesmo quem gosta, quem tem dom.

JP: Quais incentivos você acha que deveria haver por parte de políticos, governantes, para dar uma alavancada nesse esporte?

Reynaldo: Hoje já melhorou bastante. Já temos um incentivo através do governo federal. Até um tempo atrás, com o outro governador, tinha um incentivo do governo do Estado aos atletas. Eles se despontavam, tinha um ranqueamento, vinha aplicação de dinheiro. O governador atual não está dando esse apoio ao atleta. Mas tem o apoio do governo federal. O atleta que se destaca entre os três melhores do Brasil ou terceiro no ranking nacional têm a bolsa. No começo é estudantil, se for campeão escolar, recebe uma premiação ou se ele pegar entre os três do Brasil ele tem essa bolsa. Agora na questão de atrair as crianças, o ponto chave é realizar competições. Tem que ter mais competições, coisa que por exemplo em nosso Estado não temos. Aqui tem uma competição em cada categoria. A pré-mirim, que seria iniciação, crianças de 10 a 12 anos. Aqui no MS temos apenas uma competição da Federação e uma do Estado. Então é muito pouco. A criança não pensa vou treinar para uma competição. Aqui a gente faz um circuito, que todo ano é realizado, já tem mais de 15 anos que viemos realizando essa competição que é o Circuito Sesc, geralmente no começo do ano. São três meses de disputas, é para incentivar esse pessoal a participar. Outro ponto chave é o professor da escola em encaminhar essa criança. O professor está o dia a dia com ela. Por exemplo, na atividade de educação física, o professor vai perceber um atleta ou outro que se destaca em velocidade, uma habilidade maior num lançamento do handebol, que pode colocar no lançamento de dardo ou se é veloz com a bola, quer dizer, a recuperação dele é rápida. Eu por exemplo, que não tenho acesso às escolas, fico só no treinamento, sinto essa dificuldade dos professores mandarem mais alunos para treinamento, que é uma forma de incentivar.

JP: O destaque local é a Luana (Paula Pereira Braga). Para chegar ao nível dela, depende única e exclusivamente da pessoa ter uma iniciativa própria ou realmente depende desses incentivos dos técnicos ou outros programas e campeonatos?

Reynaldo: A Luana está a quase cinco anos treinando comigo. Começou com 11, 12 anos e já vai fazer 17. Quando o atleta está na fase da adolescência ainda, a gente vai levando, vai competindo. O incentivo é a competição, estar viajando. Eles gostam de viajar. Além de treinar, têm que estar competindo. O objetivo é a competição mesmo. A partir dos 15 anos, a questão financeira começa a pesar em casa. Os pais já fazem aquela cobrança do tipo poxa atletismo ou esporte em geral. Eles querem que a criança estude, arrume emprego para ter uma renda em casa. Aí entra a questão do patrocínio. Os pais queriam que ela ficasse em casa para ajudar, a mãe é empregada doméstica. Ela já ficou naquela de procurar emprego para tentar ajudar. Eu falei para ela que iria tentar ajudá-la. Comecei ajudando com um pouco do próprio bolso, até porque não tinha condição de investir muito. Agora tem uma empresa que vem colaborando com ela para que possa se manter. A partir do ano que vem, se Deus quiser, como ela foi campeão brasileira, deve entrar no bolsa atleta federal. Entra no programa nacional e deve ganhar um valor de R$ 700 aproximadamente, o que dará uma tranqüilidade para a Luana. A cobrança dos pais para ela ficar em casa deve diminuir. Se não tiver o incentivo financeiro, o atleta hoje fica sem condições. Existem muitos projetos, mas talvez a mãe não deixa ir para o atletismo por isso. Fala, não, você vai para o projeto porque lá ganha R$ 70, ou R$ 80. Estamos pensando em fazer um projeto ano que vem ou abrir uma associação. Através das empresas, da Prefeitura, governos estadual e federal ou Caixa Econômica, conseguir recursos para realizar esse projeto para as crianças.

JP: Já tem algo em mente, algo já montado ou ainda não sentou para conversar com ninguém?

Reynaldo: Converso sempre com amigos, colegas do atletismo, pessoas que gostam do esporte. A minha intenção, se tudo correr bem, com o apoio da Prefeitura, vamos conseguir montar uma associação ou um projeto de atletismo para iniciar em 2010 mesmo. Isso tudo para que possamos dar uma finalidade melhor para as crianças. Meu sonho é ter um pólo de treinamento de atletismo, no qual possamos oferecer não só a parte de treinamento, como também informática, ter um refeitório. Esse é um sonho que tenho na minha cabeça. Se vai se realizar, eu não sei, mas o sonho é esse, quer dizer, a criança vinha para o projeto treinar e contaria com um reforço escolar, informática, uma ala de recreação. Poderia se alimentar e ir para a escola. No caso, estudaria em período contrário. Agora vamos correr atrás do sonho.

JP: A Luana tem condições de participar das Olimpíadas de 2016?

Reynaldo: Hoje a Luana é um nome forte. Ela é a primeira do ranking nacional na categoria dela e a segunda no ranking sul americano. Se ela continuar melhorando como vem melhorando, como por exemplo em 2009 que ela ficou a nove centímetros do índice para o mundial (12m42), acredito que até as Olimpíadas de 2016, ela vai estar mais forte e mais estruturada. Eu acredito que ela é um nome forte, está bem próxima de representar o Brasil.

JP: Falando em Olimpíadas, o que você achou dos jogos de 2016 virem para o Brasil?

Reynaldo: Para a gente é bom, vai ter mais incentivo, tanto do governo federal, do COB, do próprio Estado, do Município. Quem tem atletas como no caso da Luana, atletas que têm chances de chegar nas Olimpíadas, receberá investimentos para que se forme uma equipe forte. Além disso, abrirá um maior número de vagas. Quando é fora do País, limitam o número de atletas. Como é no Brasil, eles podem colocar três ou até quatro atletas por prova. Isso abre uma chance a mais para que os atletas possam representar nosso País.

JP: Analisando o atletismo geral, a nível Brasil, como você avalia o esporte por aqui e o que tem que ser feito para não fazer feio em 2016?

Reynaldo: Se for comparar com Estados Unidos, Cuba, países fortes no atletismo, nossa chance de medalha ainda será pequena. Um ou outro conseguirá. Acredito que o número de medalhas pode melhorar porque agora será feito um investimento maior. Terá mais incentivo, mais parcerias entre empresas e clubes. Já começaram a fazer os camp nacionais e internacionais, que seria a parte de treinamento para evolução e melhora dos atletas. São vários pólos de treinamento. Recentemente abriu em Uberlândia (MG), Maringá (PR), Rio de Janeiro (RJ), São Paulo (SP), no Ibirapuera. E irão abrir mais pólos ainda para incentivar. A própria questão de material de treinamento que é muito difícil, setores de saltos, tanto o COB como a CBAt, que tem a Maurrem Maggi como madrinha, estão destinando setores de salto às cidades, entidades e escolas que mais necessitam, para a prática maior do salto em distância, salto triplo. Esse é o chamariz para a criançada ir e melhorar o nível nacional.

JP: Que conselho você daria para quem quer começar no atletismo?

Reynaldo: Na faixa etária de 10 a 12 anos, o treinamento é bem mais suave. Já começa um trabalho específico para o atletismo, mas através de brincadeiras, recreação e por aí trabalha a parte de coordenação do atleta. Praticamente é como ensiná-los a correr. Trabalha-se com barreirinhas, joguinhos, para que eles comecem a tomar gosto. Há quatro ou cinco anos atrás, começamos a trabalhar muito com alto nível e deixamos as crianças um pouco de lado. Olhávamos muito para o resultado, atletas ganhando campeonatos brasileiros, medalhas internacionais. Queira ou não, você tem que ficar de olho naquele pessoal para não diminuir a carga de treinamento. Agora voltamos a trabalhar com a base, com essa faixa etária mencionada. Tem uma turminha legal lá que estamos trabalhando, disputamos competição em Campo Grande, em Ilha Solteira (SP). Várias tiveram bons resultados e acabam gostando.

JP: Voltando para Três Lagoas, como você avalia o apoio recebido pela Prefeitura e empresas? Está bom como está ou poderia ser melhor?

Reynaldo: Com certeza, com a administração da prefeita Simone Tebet, melhorou bastante. Não podemos reclamar. Todas as competições que quisemos participar, tanto em São Paulo ou qualquer, lugar nós fomos. Nosso carro chefe é São Paulo. O motivo é a pista. Por exemplo, no Ibirapuera tem uma pista ideal, tem controle de vento, o que não temos aqui. É necessário calcular a velocidade do vento tanto no salto em distância, quanto nas provas de velocidade. Às vezes, alguém daqui faz uma marca boa, mas não vale porque não tem a velocidade do vento, por isso vamos até São Paulo. Na parte de viagem, a secretaria de Esportes e a Prefeita sempre nos apoiaram, tanto é que os resultados de cinco anos para cá vêm melhorando. Lógico que o objetivo nosso é melhorar ainda mais para poder elevar o nome de nossa Cidade.